O pacto de silêncio

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--- 12 horas.

"Pode vesti-lo" -, disse Vanessa guardando a filmadora. Maria José o vestiu com carinho. Daniel parecia mais ligado no que estava acontecendo em sua volta, percebeu a cuidadora.

"Ele não se comunicou hora nenhuma desde a volta?" -, perguntou Vanessa aleatoriamente. Maria José pensou antes de responder: "Comigo não; a mãe não me relatou nada".

Vanessa pegou um papel e um lápis preto. Degastou a ponta. "Verbalmente eles não se comunicam. Ainda está recente para conseguirem retomar a fala. Esse é um dos pontos que estamos estudando" -, explicou.

Maria o colocou sentado e calçou o Tênis no rapaz. Percebeu o seu pé mais gelado. Era incomum um pé gelado como aquele. Apertou as mãos. Estavam frias e os dedos arroxeados. Vanessa notou a estranheza da senhora.

"É comum esse processo. Ele deve ter perdido sangue. A temperatura do corpo dos abduzidos são bem mais abaixo do que a nossa" -, explicou Vanessa. Para a cabeça materna de Maria José, isso não significava nada. Frio era frio. Pegou uma jaqueta no guarda-roupa do rapaz e o vestiu.

"Isso deve ajuda-lo a ficar mais quentinho".

Vanessa sorriu disfarçadamente sem que Maria percebesse, afinal, a pobre mulher não sabia diante do que estava. Maria ajeitou o seu cabeço e sentiu um aperto no coração: "Meu pobre, rapaz, que destino triste o seu. Um moço tão lindo!" -, seus olhos encheram de lágrimas e Daniel ergueu o seu dedo para limpá-las.

Assim que a lágrima quente tocou o seu dedo gelado ele levou a mão a direção dos olhos e colocou a lágrima em seus olhos. Vanessa olhou para a cena com surpresa. Maria não entendia nada. Puxou a mão dele entre as suas e a esfregou no intuito de aquecer. Depois deu um beijo e encostou em sua face.

Ele se levantou e fez o mesmo com ela.

"Deixe-o descobrir o contato, por favor. Isso será importante no desenvolvimento dele" -, explicou Vanessa. Maria sorriu para ele. Ele se assustou e caiu sentado sobre a cama.

"Dentes muito expostos podem remeter hostilidade em algumas culturas. Ele deve ter aprendido isso enquanto esteve entre eles" -, explicou Vanessa olhando o relógio e anotando os comportamentos num caderninho.

Vanessa pegou uma prancheta e colocou folhas em branco. Pegou o lápis e entregou ao jovem caído sobre a cama. Maria o ajeitou e ele ficou imóvel, como se tivesse medo de Maria. Ela percebeu o medo. Acariciou a sua cabeça, lhe deu um beijo e fez carinhos no seu rosto. Ele continuou imóvel como um animal de rua que se deixa explorar ao faro curioso do outro sem esboçar ação alguma para não obter reação.

"Afaste-se, por favor, vamos aproveitar esse contato para que ele exponha os sentimentos. A comunicação não-verbal nos dirá muito sobre o estado dele"-, afirmou Vanessa.

Maria sentiu-se rejeitada pela doutora. "Como pode saber tanto assim?" -, disse calmamente sem esconder o despeito.

"Psiquiatria, ginecologia e outras especializações do comportamento humano e animal. Anos de estudo, Dona Maria José" -, disse Vanessa enquanto observava a reação de Daniel contemplando o papel e a prancheta.

Vanessa aproximou e segurou o lápis na mão do rapaz. Rabiscou algumas bolinhas segurando a mão do rapaz. Logo ele começou a forçar o lápis contra a prancheta. "Isso, é para isso que servem essas coisas". Tirou a folha rabiscada e segurou a mão de Daniel.

Passou a mão sobre o peito de Daniel e ele olhou para ela. "Como se sente? Use esse lápis para se colocar para fora" -, fez uma tentativa de contato verbal. Daniel ainda a olhava. Vanessa tentou novamente: "Folha, desenho, sentir". Fez o gesto com as mãos no ar de rabisca r Daniel abaixou a cabeça e fez um risco forte no meio da folha.

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