Capítulo VIII -Dr. Miller: Razão e Fé

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Eu não tinha saída, sentado sobre um armário, cercado por enfermos agressivos de uma doença desconhecida.

Quando os vi pela primeira vez, perguntei o que estava acontecendo, mas eles pareciam não ouvir ou mesmo não entender as palavras, caminhavam em minha direção com o olhar fixo, estavam salivando e apresentavam o mesmo aspecto do paciente que foi o motivo de minha ida ao hospital naquele dia. Pávido, tentei retornar para o quarto de descanso, porém a combinação do medo com minha péssima condição física impediu o sucesso no intento. Ao tentar me virar apressado, caí e sem tempo para me levantar me afastei da forma que foi possível, sentado no chão em desespero, indefeso. Apesar de querer gritar, só consegui murmurar:

- Meu deus...

Estava perto de ser atacado quando acidentalmente derrubei uma lixeira com meus pés fazendo as criaturas se atrapalharem tempo o suficiente para, num breve lampejo de coragem, me reerguer e tentar passar correndo entre eles. Aquilo que um dia foi uma enfermeira segurou me braço, mas o puxei com força, suas unhas rasgaram a manga do jaleco e minha pele, não que isto tivesse sido constatado por mim no momento, eu só pensava em chegar ao meu escaninho, pode parecer loucura, mas eu tinha uma arma escondida na caixa de meu estetoscópio. Meses antes havia parecido a mim uma boa ideia tirá-la de casa depois de tê-la enfiado na boca algumas vezes completamente bêbado. Tive medo que a coragem viesse com uma próxima garrafa de whisky. No fim a estupidez que fizera para prevenir outra poderia ser minha salvação.

Alcancei o armário, mas a sala estava cheia de doentes, se aproximavam enquanto eu lutava contra os tremores em minhas mãos que por fim fizeram cair a chave, não havia mais tempo, apavorado puxei uma cadeira e a usei para subir naquele que se tornou uma ilha de metal em meio a um apavorante mar de assombros. Meu refúgio era alto e pesado, mas temi que pudesse ser derrubado se eles o puxassem.

Aos poucos surgiam mais, naquela aterrorizante marcha claudicante, alguns pacientes, outros trabalhadores do hospital, fiquei espantado com a velocidade de transmissão, era sem dúvida uma doença devastadora. Pelos sintomas, assemelhava-se à raiva mas era perceptivelmente mais poderosa, mesmo assim, não poderia ter iniciado com apenas um paciente, outros infectados deviam ter dado entrada. Era preciso isolar todos no prédio ou teríamos um surto epidêmico devastador.

De onde estava pude observar e entender que os infectados tinha sua capacidade de raciocínio reduzida pois, mesmo com a cadeira ainda próxima ao armário, não fizeram tentativas de subir, permaneciam com o olhar fixo em mim, levantando os braços e grunhindo. Apesar de toda a agressividade que testemunhei antes, eles não se agrediam.

Consciente das limitações deles e muito cansado, abaixei a cabeça, examinei o ferimento em meu braço e removi unhas da enfermeira que ficaram encravadas na pele, o ferimento ardia e latejava mas não havia nada que eu pudesse fazer. Tentando me acalmar, pensei em minha ex-mulher, seus lindos olhos, o sorriso alegre e os bons momentos, depois os dolorosos, a dedicação em formar um lar feliz, pela qual foi compensada com minha obsessão pela carreira e preocupação excessiva com dinheiro e bens materiais. Eu precisava sobreviver e reencontrá-la, não para pedí-la que voltasse, apenas para pedir perdão por não ter cumprido o que prometemos por várias vezes, abraçados quando o que importava era apenas ter um ao outro.

Nunca foi um homem que pudesse ser considerado religioso, mas naquele momento fechei meus olhos e rezei, em parte com medo do peso de meus pecados, em outra com uma faísca de esperança.

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